A decisão foi tornada pública esta quarta-feira, 28 de Março, pela sociedade de advogados CCA Ontier, que representou a proprietária.


O Tribunal da Relação de Lisboa considerava que a actividade de alojamento local é incompatível com o uso para habitação que estava previsto para o apartamento em causa. Por isso, sendo "comércio", não devia existir naquela mesma fracção.


Já o Supremo Tribunal de Justiça segue em sentido contrário, considerando que o acórdão do Tribunal da Relação "parece lavrar uma enorme confusão".


"Na verdade, o facto de a recorrente ceder onerosamente a sua fracção mobilada a turistas constituir um acto de comércio não significa que a fracção se exerça o comércio, pois a cedência destina-se à respectiva habitação", pode ler-se na decisão do Supremo a que o Negócios teve acesso.


Esta última deliberação vem na linha de outra tomada pelo Tribunal da Relação do Porto, que entendeu que o condomínio não tinha poder para bloquear o alojamento local, uma vez que a actividade não violava o título constitutivo da propriedade.


"O conceito de alojamento está contido no conceito de habitação. A utilização para alojamento de turistas não diverge da utilização para habitação. A pessoa alojada não pratica no local de alojamento algo que nela não pratique quem nele habita: dorme, descansa, pernoita, tem as suas coisas", considera o acórdão de Setembro de 2016 da Relação do Porto.


Quanto às queixas de estranhos no prédio, barulho e desgaste nas zonas comuns, o tribunal acredita que o impacto dos turistas pode 
ficar "mesmo aquém do que seria feito pelos membros desse agregado" que ocuparia a casa.


Visão diferente teve a Relação de Lisboa, defendendo que "prevalece o direito à habitação, superior ao direito ao comércio e ao lucro" e sugerindo à condómina que arrende a casa no mercado habitacional em vez de explorar a actividade de alojamento local.

                                                                                                                                                                        

"É a condómina recorrida quem viola a lei, praticando uma actividade comercial numa fracção de uso exclusivamente habitacional, podendo retirar rendimento da referida fracção, colocando-a, por exemplo, no mercado de arrendamento", explicou a instância.
 

A mesma considerou ainda "irrelevante" que o espaço estivesse devidamente licenciado pelo Turismo de Portugal e pela autarquia, cujo Plano de Director Municipal (PDM) define o alojamento local como habitação.



Como escreveu o Negócios, esta "guerra de condomínios" podia ir parar ao Supremo Tribunal de Justiça. Só aqui se torna caso julgado e definirá uma regra, após três decisões da instância, a aplicar em todas as disputas do género.


"Nestes casos, seria importante os condomínios começarem a adoptar uma atitude menos proibicionista e mais positiva, procurando vias amigáveis de resolução dos conflitos em causa, em sede do próprio condomínio e das respectivas assembleias de condomínio, por obediência a um princípio de boa vizinhança subjacente à lei, evitando o imediato recurso à via judicial", aconselham os advogados da CCA Ontier responsáveis por este caso, Marta Duarte e Gonçalo de Almeida Costa.

O mesmo defende a Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), que reagiu em comunicado. A organização que representa o sector considera que "esta decisão é importante pois traz estabilidade jurídica a uma actividade que tem ganho um peso crescente não só a nível económico mas também social, uma vez que já há milhares de famílias que dependem do alojamento local.

A ALEP, liderada por Eduardo Miranda, lembra ainda que vai apresentar um Manual de Boas Práticas do Alojamento Local "nas próximas semanas", numa tentativa de promover um "espírito de boa vizinhança e de cooperação" nos condomínios onde exista esta actividade.

 

Fonte: Jornal de Negócios